UMA PALINHA...CASAMENTO CIVIL

UMA PALINHA...CASAMENTO CIVIL


“Você é muito importante em nossas vidas, por isso, através desta lembrança, informamos que, no dia 11 de fevereiro de 2011, no Cartório Vilella, realizaremos um grande sonho...”. Este era parte do texto do bonito cartão, impecàvelmente subscrito e enviado aos parentes e amigos mais chegados dos noivos Cristiane e Lucas.
O hall de acesso ao Cartório estava abarrotado de convidados, não só destes noivinhos, tema deste texto, como, também, de outros dezessete pares devidamente estressados, não só pelo evento que se aproximava, mas, também, pelo excesso de calor reinante (soube que faziam 36,3 graus centígrados à sombra).
Pois bem. São treze horas e cinqüenta minutos. Nem um minuto a mais, nem a menos. A douta Juíza de paz, uma jovem senhora de oitenta e oito anos convida os noivinhos a entrarem para a sala de execução, ou melhor, sala de concretização de sonhos. A propósito, o Luquinha não só sonhara antes como, ainda, sonhava, e muito. Sonhava e suava.
A sua camisa nova, encomendada especialmente para este evento, já se encontrava um pouco suada e com aquele cheiro característico, porém não o suficiente para afastar qualquer dos convidados que lotaram a pequenina sala que, conforme disse, não era de execução.
O sr. Luis-Mar, jovem e próspero empresário do ramo de energia elétrica, porém muito odiado pelas grandes fornecedoras deste bem, se apresentava impecavelmente trajado, talvez para não fazer feio diante de sua sempre super-elegante Dorinha. Ela esbanjando tranquilidade, ainda que pudesse não estar, e ele esbanjando nervosismo, ainda que pudesse não estar. Ambos adentram o salãozinho, que parecia ainda menor pela quantidade de testemunhas presentes. Só a Patrícia, com suas muletas e a perna esticada sobre um banquinho, ocupava trinta por cento do espaço destinado aos convidados e um pouquinho do espaço destinado à mesa da douta Juíza.
De repente, este que vos escreve, recebe um pedido que era mais que uma ordem:
- “ô André, filma pra nós. É só apertar aqui e filmar” - ordenou o jovem senhor me passando a poderosa câmera de gravar momentos eternos.
Não tive como recusar, e nem poderia, inda mais com a pressa que me foi solicitado.
- “mas aperto aonde?! Aperto e solto ou aperto e fico pressionando?!...
Estas dúvidas não tiveram tempo suficiente para os devidos esclarecimentos, já que a douta Juíza, preocupada com mais de seis outros casais que já esperavam no hall, foi logo dando início à degola, ou melhor, ao casório:
- “declaro, na forma da lei...”.
Não tive escolha. Meti o dedo no gatilho com toda minha força e comecei minha tarefa. Foquei primeiramente a noiva, depois o noivo, os pais dela, a sogra dele, convidado por convidado, testemunha por testemunha. Todo o cuidado era pouco. Procurei não tremer, movimentava lentamente o equipamento procurando dar melhor qualidade ao produto final. Agachava, ficava na ponta do pé, me entortava e etc procurando sempre um melhor ângulo. Dava sugestões como um profissional:
- Ô Cris, coloca sua mão sobre a mãozinha do noivo” – disse com carinho.
As alianças, recém-polidas, se faziam notar, de longe, pelo excessivo brilho, resultado do polimento que receberam horas antes.
Tudo está ocorrendo às mil maravilhas: o noivo não desmaiou, a noiva tremeu pouco, a sogra dele não falou, nenhuma criança chorou, nenhum cachorro chegou perto para acariciar a perna de alguém, a filmadora não acusou nenhum defeito.
- “assim, damos por encerrada a seção...” – concluiu a simpática anciã de dias.
Entre os abraços e desejos de felicidades que corriam solto, fui em direção ao sr. Luiz-Mar com o sentimento do dever cumprido:
- “toma chefe” – disse eu eufóricamente. – “não soltei o botão nenhum segundo, graças a Deus” – concluí.
- “Cê não filmou nada” – respondeu-me o sr. Mar, como é conhecido pelos mais íntimos. –“ cê tinha que apertar e soltar, assim oh, tá vendo? Quando aparece a letra em vermelho, tá filmando, quando tá verde é pausa!”
- “Ah, agora entendi! Prometo não errar no casamento da Isabela...”
Desculpem, Luquinha e Cris.
Não me queira mal, amigo Luis-Mar.


                                       André Heringer Lisboa
                                       J.Fora, 11 de fevereiro de 2011